Plano de saúde é obrigado a cobrir terapias para criança autista, decide Justiça
Uma recente decisão da Justiça determinou que planos de saúde devem custear terapias necessárias para o tratamento de crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA), reforçando a obrigação das operadoras em garantir a cobertura integral de tratamentos específicos para esse público. A sentença trouxe alívio para muitas famílias que enfrentam dificuldades com os altos custos das terapias essenciais para o desenvolvimento e bem-estar das crianças diagnosticadas com TEA.
A luta pelo direito ao tratamento completo
A decisão judicial veio após uma família recorrer ao Judiciário para assegurar que o plano de saúde arcasse com as terapias recomendadas pelo médico da criança. Essas terapias incluem tratamentos com fonoaudiólogo, psicólogo, terapeuta ocupacional, entre outros, indispensáveis para o progresso no desenvolvimento cognitivo e social do menor.
Em sua defesa, o plano de saúde argumentou que a cobertura das terapias estava limitada ao rol de procedimentos estabelecido pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). No entanto, o juiz responsável pelo caso considerou que, mesmo que algumas terapias não estejam explicitamente listadas no rol da ANS, elas são imprescindíveis para garantir o tratamento adequado e o desenvolvimento saudável da criança com TEA.
“É inaceitável que uma criança autista tenha que abrir mão de tratamentos essenciais por questões burocráticas”, afirmou o magistrado na decisão. Ele ressaltou que a negativa de cobertura viola o direito à saúde e à dignidade da criança, princípios garantidos pela Constituição Federal e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente.
O impacto da decisão para outras famílias
A sentença tem um peso especial porque estabelece um precedente para outras ações judiciais similares em todo o país. Muitas famílias de crianças autistas enfrentam dificuldades para obter cobertura integral de terapias que, muitas vezes, representam altos custos mensais. A decisão reacende o debate sobre o papel dos planos de saúde no cumprimento de sua função social e na necessidade de uma regulamentação mais inclusiva que atenda a casos de saúde mental e condições como o autismo.
Segundo especialistas em Direito à Saúde, a decisão abre um caminho importante para que outros juízes interpretem o rol da ANS como um indicativo mínimo e não como uma lista exaustiva. Isso significa que as operadoras de saúde podem ser obrigadas a custear terapias que não constam no rol da ANS, desde que devidamente prescritas e necessárias para o tratamento da condição do paciente.
Direitos garantidos, burocracia enfrentada
Essa não é a primeira vez que a Justiça é acionada para garantir direitos de pacientes com TEA. Em 2022, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já havia decidido que o rol da ANS tem caráter exemplificativo, o que abriu margem para que tratamentos fora da lista obrigatória fossem garantidos aos beneficiários de planos de saúde, mediante recomendação médica.
No entanto, ainda há um longo caminho a percorrer, já que muitos planos de saúde recorrem para evitar a cobertura de terapias que consideram onerosas. Para as famílias, essa luta envolve não apenas a busca por um tratamento adequado, mas também a superação de barreiras burocráticas que acabam prejudicando o desenvolvimento das crianças.
“A saúde é um direito de todos e um dever do Estado, e isso inclui a regulação de serviços privados”, explica a advogada de saúde Renata Mendes, que representa a família beneficiada pela decisão judicial. Ela destaca que a falta de cobertura dos planos para terapias específicas impõe um fardo financeiro insustentável para muitas famílias e pode comprometer o desenvolvimento e a qualidade de vida das crianças com autismo.
O caminho para uma regulamentação mais inclusiva
Entidades ligadas aos direitos das pessoas com deficiência, como o Instituto Autismo & Sociedade, apontam a necessidade urgente de uma revisão nas normas que regulamentam os planos de saúde no Brasil. Segundo a entidade, a inclusão de terapias específicas para o autismo na cobertura dos planos é fundamental para assegurar que todas as crianças autistas tenham acesso a um desenvolvimento pleno e saudável.
Especialistas também defendem que a ANS amplie o rol de procedimentos, incluindo terapias multidisciplinares para TEA. Essa atualização poderia minimizar a necessidade de ações judiciais, garantindo que o direito à saúde das crianças autistas seja respeitado de forma ampla.
“A regulamentação atual já não acompanha a demanda e os avanços no tratamento do autismo e outras condições similares. Atualizar o rol de procedimentos da ANS e alinhar a cobertura dos planos de saúde com as necessidades reais dos pacientes é essencial para um sistema mais justo e inclusivo”, afirma o psicólogo e pesquisador Rafael Campos, que atua na área de políticas de saúde.